Archive for 2010

Encontros e desencontros de uma Lua 2


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Aline não podia sentir-se mais feliz. Pensava que ele a tivesse esquecido. Mas mal sabia ela que seu amor estava tão vivo quanto antes. Sentiu mil borboletas dançarem em seu estômago. Os dois ficaram durante dias se encontrando na praia, onde conversavam e contavam sobre suas vidas. Havia tanto o que falar. Eram dois pequenos apaixonadas outra vez. Fernando estava encantado.
Na manhã de 23 de dezembro, Aline o convidou para ceia de Natal com sua família. Ele aceitou imediatamente e estava visivelmente ansioso. Ela queria que tudo saísse perfeito. Mas talvez os encantos da lua e do amor reencontrado a tivesse feito esquecer-se de tudo ao seu redor. Na mesma manhã, Henrique voltou para Santos. Aline quase teve uma síncope ao vê-lo parado em sua porta. Tinha esquecido completamente que seu namorado voltaria para o Natal.
Não sabia o que fazer. Contou a melhor amiga tudo o que havia acontecido. Ela não podia simplesmente esquecer-se do namorado que tanto a amou. Não poderia esquecer-se de tudo que passaram juntos. Mas agora, o que ela realmente sentia? Talvez estivesse enganada sobre Fernando, uma paixão jovem, que agora podia não significar nada. Não conhecia os sentimentos de Fernando. Se tomasse uma decisão precipitada poderia arruinar o Natal.
Era noite de lua cheia, mas havia muitas nuvens no céu. Nuvens de dúvidas. Nada de ilusões, agora Fernando é apenas um bom amigo, disse a seu próprio coração. Porém, não conseguia controlar as fortes e rápidas batidas dele quando Fernando se aproximava. Será que seu amor por Henrique estava acabado?
Era para ser uma noite natalina especial. No entanto, seus anseios deixaram-na bastante desconfortável quando acordou na véspera de Natal. Encontrou na mesa da cozinha dois buquês de flores. Um era de majestosas rosas vermelhas e outro de lindas orquídeas. Ela amava orquídeas, eram de Fernando.
Respirou fundo, pegou o telefone. Mas ele tocou antes. Henrique queria conversar. Disse que ela estava estranha e parecia meio insegura. Aline apenas confirmou. Talvez quisesse dizer algo, mas teve receio por ser Natal? Indagou Henrique. E ela continuou a confirmar. Havia prometido sinceridade a ele. A conversa não continuou mais.
Naquela noite, a casa estava cheia de amigos. Aline apresentou Henrique a Fernando, que não poderia ter ficado mais arrasado com a notícia de que Aline tinha um namorado. Céus! Tinha que pegar o presente que dera a Aline antes que ela o abrisse! Procurou pela árvore, mas não o encontrou. Alguns minutos depois, percebeu que era tarde demais, o pacote parecia que já fora aberto. Pelo menos o panetone é de chocolate, pensou. Uma janela emoldurava a lua brilhante no céu. Se pudesse fazer algo...
Henrique puxou Aline para um canto. E perguntou o que realmente sentia por seu amigo Fernando. Ela ficou em silêncio. Ele pegou um pacote um pouco amassado, pediu desculpas. Disse que sabia o que estava acontecendo e que era hora de não esconder mais nada. Podia tê-la como completa amiga, mas não podia ter uma meia-namorada, disse ele. E então, pediu desculpas novamente, entregou o pacote e foi embora.
Aline ficou atordoada. Abriu o pacote e descobriu que era de Fernando. Havia uma corrente com um pingente em forma de lua e uma carta enorme declarando seu amor e seus sentimentos por ela. Relembrando os momentos que passaram juntos, coisas que disseram um ao outro. E terminava com “Eu te amo”. Aline sorriu ao terminar de ler.
Lá estava ele, debruçado na janela, olhando para a lua. Ela se aproximou e sorriu. Eu também, disse ela. Então, eles se beijaram, tão tradicionalmente, debaixo do visgo de Natal, para nunca mais desencontrar-se. 


P.S. da Autora: Como alguns estavam curiosos por uma continuação da história, eis o meu presente de Natal para vocês! Espero que me perdoem pela ausência e demora, mas o fim de ano está sendo extremamente corrido e atarefado para mim. Obrigada pelos comentários e carinho de sempre. Com amor, Feliz Natal e Boas Festas!

Etapas impacientes


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Você já se perguntou "quanto tempo eu preciso esperar"? Sabe, quando você quer muito uma coisa e quer que aconteça logo? 
Sempre fui muito ansiosa, mas acho que isso não é uma coisa boa. Às vezes nós ansiosos somos pegos pelo desânimo. Como eu gostaria de saber esperar pacientemente! E é difícil de acreditar que existem pessoas tão pacientes, que fazem as coisas por etapas. Etapas! Céus, tem vezes que eu adoraria pular um monte de etapas. Tipo quando você está escutando um CD e tem aquela música no meio, bem chata, e então você pega o controle e passa pra próxima. Ah, eu queria esse controle na vida. Mas não dá pra pular etapas. Quero dizer, até dá. Mas depois você acaba perdendo a essência de coisas maravilhosas. Como diz o ditado: "O mel nunca é tão doce sem o fel". Então, por que não aguentar aquela musiquinha irritante por 2 ou 3 minutos e esperar? Porque quando finalmente a sua faixa predileta tocar, ela será ainda melhor! Tudo bem, eu perdoo se não gostou da metáfora. Enfim, etapas são importantes, são a nossa jornada.
Eu tenho minhas metas e até elas serem concluídas, vou precisar dessa virtude de paciência pra tolerar os fatos indesejados. Nem sempre alcançamos logo de primeira, todo salto precisa de impulso. E dependendo de onde você quer chegar, vai precisar de muito impulso. É... paciência!

P.S.: Ganhei selinho do blog Dby's Blog, adorei! Merci!

Sobre hábitos e seus resultados


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Podemos achar que a definição do caráter de alguém se dá num momento de "clímax", de provas e grandes desafios. Mas apenas se torna evidente nestes momentos. A verdade é que as características se formam pelas pequenas e insignificantes escolhas diárias. Por exemplo,  eu poderia definir alguém, como simpático, educado e bem-humorado, não porque ganhou o Prêmio Nobel da Paz, mas porque diariamente esse alguém sempre foi sorridente, conversava com todos e não se irritava facilmente. São coisas simples que definem grandes coisas.
O que eu aprendi numa aula de filosofia há muito tempo e nunca esqueci foi que nossas ações nos levam aos nossos hábitos, que transformam nosso caráter. E o caráter? Nos leva ao que seremos.
Estava pensando sobre como nos tornamos o que somos hoje. Nossas qualidades, nossos defeitos, nossos gostos. E percebi que tudo isso, nós construímos ao longo do tempo com nossas descobertas e o modo como vivemos. É claro que podemos sempre mudar. Fazer outras escolhas. Porque hoje podemos querer uma coisa e amanhã outra, mas os resultados são a soma das pequenas escolhas e dos hábitos.


Todos da família achavam um absurdo quando Gabriel, aos 8 anos, dizia que seria médico quando crescesse. A mãe tentava alertá-lo dizendo que ele não tinha vocação para isso. Todos sabiam que ele mal podia ver sangue, imagine ser médico! Mas Gabriel achava que isso não importava muito. Ele se imaginava usando aquela roupa branca e falando sobre doenças e acidentes. Ficava no espelho fingindo ser um.
— Sinto muito... mas sua filha só tem uma semana de vida! Faremos uma última operação!
Ele tentava convencer a todos de que seria um médico ideal. Anos mais tarde, Gabriel tornou-se médico. Como personagem de uma peça de teatro.

Encontros e desencontros de uma Lua


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Fernando estava ansioso. Teria uma prova importante do dia seguinte e precisava de muita concentração. Ele estava preparado e só precisava relaxar. Abriu qualquer livro, talvez um de Machado. Leu algumas linhas, mas não conseguia se concentrar em nada. Foi até a sacada. 
E lá encontrou aquela brilhante lua. Sentiu uma brisa gelada, mas continuou ali. Esperou, como se tivesse hora marcada. E então, foi quando percebeu que a lua projetava sua luz em uma paisagem ainda mais deslumbrante. Uma bela moça estava ali embaixo. O preto do seu cabelo exibia os reflexos da lua. Sim, da lua. Mas ele não podia simplesmente chegar até ela. Ele não a conhecia. Apenas admirou a bela paisagem que tinha.
No dia seguinte, enquanto fazia a prova, se lembrou da paisagem que tornou-se para ele a sua favorita. Mas nada de ilusões, aquilo fora apenas um encanto pela sua beleza. Entregou a prova e  ao passar pela porta esbarrou em Aline. Imediatamente a reconheceu da noite anterior, ainda podia ver nela o brilho lunar. Estava tão perto e ainda assim parecia tão longe.
Na mesma noite, Fernando olhou pela sacada, ainda na esperança de reencontrá-la. E para o seu contentamento, lá estava ela, embaixo da mesma lua. Resolveu tomar alguma atitude. Foi até lá, disse boa noite. Ela respondeu educadamente. E naquele instante percebeu: aquela era a mesma lua de anos atrás. Ela pronunciou suavemente seu nome. E ele a reconheceu. Aquela mesma menina por quem ele era tão apaixonado, estava ali novamente. Ele teve a certeza de que o amor poderia superar o tempo e os desencontros... e voltar com o mesmo esplendor, assim como depois de uma lua nova, ela volta a brilhar novamente.

Drama e Comédia: enfermidades


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Me parece que a maioria das pessoas excessivamente dramáticas tem uma certa tendência a serem hipocondríacas, ou ao menos parecem ser. E as pessoas excessivamente bem-humoradas tem uma tendência a não se importarem muito com doenças, aliás, até brincam com a morte.
Amanda parecia uma estátua na sala de estar. Os olhos arregalados, a respiração ofegante. 
— Que maluquice é essa agora? — gritou Amélia, ao chegar e atirar-se no sofá.
— Amiga... — disse num tom baixo — meus batimentos cardíacos... minha visão distorcida...
— Ah, você está ensaiando pra peça teatral! Que legal!
Amanda virou-se para ela, encarando com um ar sério:
— Não estou brincando! É grave a situação!
— O que tu tem? Asma? 
— Asma não causa visão distorcida, né?
— Sei lá, não sou médica! Mas você deveria ir em um logo, antes que morra! — brincou.
— É... — lacrimejou — vou escrever algumas cartas.
Amélia deitou-se de tanto rir. Mas quando percebeu que Amanda continuava séria, parou.
— Você vai escrever um testamento, é?
— Sim, não posso deixar tudo como está!
— Primeiro, você não tem herança pra deixar. Segundo, mesmo que tivesse tu nem ia ter pra quem deixar!
— Então, escreverei cartas de despedida.
— Você nem sabe se vai morrer! Vai que você não morre, perdeu tempo escrevendo isso. E ainda gastando papel sem necessidade. Então, digita no computador logo. Caso você morra, eu aviso o pessoal, beleza?
— Amélia, preciso de remédios! Talvez não haja tempo para cartas! Me leve ao médico!
— Se acalma! Qualquer coisa eu ligo pro meu primo!
— Sério? Ele é médico? 
— Ahn... coveiro.

P.S.: Depois de uma enquete feita no blog, "Drama e Comédia" foi escolhido como melhor texto de ficção, então resolvi fazer um outro episódio. Leia ainda: Drama e Comédia

Essa conversa deu fome


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Minha amiga L. é muito engraçada. É superelétrica, fala demais, não para quieta e só pensa em comida. Estavámos andando, quando:
— Você não tá com fome, não?
— Não, eu comi um sanduíche antes de sair de casa. — respondi.
— Ah, eu estou morrendo de fome! 
— Você não comeu?
— Só um doce. Ai, que vontade de comer meus doces!
— Minha nossa!
— Eu gasto muito com doces. Vai uns 50 reais só de paçoca. Meu doce preferido é paçoca! Eu adoro paçoca, você não tem noção! — continuou L. — Todo dia eu como paçoca...
— É melhor prestar atenção nos carros, se não ao invés de morrer de fome, vai morrer atropelada!
— Ai, odeio pegar ônibus. Demora demais.
— Enquanto isso, você fica comendo, né?
— Ah, fico estudando também. Mas eu gosto de estudar comendo... em dia de prova, então! Eu como o pote todo de paçoca.
— Falando nisso, eu comi uma paçoca com cobertura de chocolate, é uma delícia. — comentei.
— Sério? Hum. Pára! — ela ergueu os braços e começou a farejar e eu, assustada, olhei pra todos os lados.
— O quê?!
— Tô sentindo cheiro de churros.
— Ahn?
Dois segundos depois, um carro de doces vira a esquina. L. ficou hipnotizada. E eu mais assustada.
— Hm...
O carro de doces: "temos brigadeiro..."
— Hm...
O carro de doces: "doce de leite..."
— Hm...
— Céus... — eu disse.
Depois que o carro estava bem longe, continuamos:
— Então, fui ao shopping com minha mãe, e você não sabe! — contava ela. — Nós íamos no cinema, eu fui comprar o ingresso. E comprei das 14h e ela comprou das 16h! E deu o maior rolo...
— Eita, e aí?
— É, aí que nós fomos comer no McDonald's.
— Ah. — eu já não estava nem um pouco surpresa.
Ao atravessarmos a rua, um carro passa correndo e eu tive que puxar a L. pra não ser atropelada.
— Ai! ... — exclamou ela.
Eu olhei pra ver se estava tudo bem.
— ... que fome.

Querida Lei de Murphy


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"Se alguma coisa pode dar errado, com certeza dará!" 
É provável que 98% do mundo conheça a lei de Murphy. Caso não, você já deve ter vivido essa lei. Sabe  aquele dia que nada pode dar errado, e dá? E da pior forma possível? Ou tudo leva mais tempo do que o tempo que você tem disponível? Ou a torrada cai sempre com a manteiga virada para baixo?
Com o tempo aprendi a rir dessa lei. Acho que o ultranegativismo se torna engraçado se olharmos a vida com outros olhos. Uma hora vamos ter que nos conformar que a vida não é perfeita. E que gastamos um tempão dando importância às nossas preocupações, quando, na verdade a preocupação não irá garantir o sucesso total. As noites mal dormidas, o choro, o nervosismo e tantas coisas negativas não farão com que algo se torne positivo. Não adianta.
Eu mesma estava fazendo um projeto. Recolhi todas as informações necessárias, fiz tudo que deveria ser feito. Mas não dava pra garantir que daria tudo excepcionalmente certo. Não dá pra imaginar o que pode acontecer. Então, se eu fiz tudo que podia, agora era apenas esperar pelo resultado. E como a lei de Murphy costuma acontecer nas horas impróprias, deu uma coisinha errada que poderia colocar tudo a perder. Mas e aí? Adiantaria eu matar o gato da vizinha (odeio gatos, sorry) por causa disso? Aconteceu? Então, vamos achar a solução. E se não houver? Continue. Existe a oposição. Vamos ter que lidar com ela. E eu acabei descobrindo que dá pra lidar com ela, e com ótimo humor ainda. 
Quando eu acabei não ligando ou me desesperando para o problema, ele acabou sendo resolvido sem que eu esperasse. Temos que fazer o que estiver ao nosso alcance sem esperar que as coisas (boas ou ruins) aconteçam.


Marcos estava atrasado. O despertador havia quebrado justo no dia de sua apresentação na faculdade. Encheu um copo de leite e quando tomou um gole sentiu o gosto horrível descendo em sua garganta. Havia trocado açúcar por sal.
Deixou o copo de lado e foi procurar suas chaves. Quinze minutos depois, ele as encontrou ao lado do açúcar. Resmungando, chutando e derrubando tudo pelo caminho foi até a porta, girou uma chave e a quebrou. Ligou correndo para o chaveiro. Depois de quase 1 hora, o problema foi resolvido. Desceu correndo as escadas do prédio, afinal, pensou, o elevador também poderia quebrar.
Mas no fim da escadaria ele tropeçou no balde de tinta. O zelador estava pintando os corredores do edifício. Depois de milhares de reclamações, quando colocou o pé da rua, leu: rua interditada. Agora, ele deveria andar cinco quadras  até o próximo ponto de ônibus.
"Não acredito, justo hoje. Em um dia tão importante!"
Quando havia acabado de gritar isso para si mesmo, uma bicicleta o atropelou. Cheio arranhões e muito dolorido, ele resolveu voltar para casa. Usou o elevador. Que parou no terceiro andar e depois de 20 minutos voltou a funcionar. Em sua casa, se atirou no sofá. E então, o telefone tocou. Marcos olhou com espanto para o aparelho, com medo da notícia que poderia vir. Resolveu atender:
— Marcos! Você não vem pra cá? — disse Denise, sua colega da faculdade.
— Ah, infelizmente não.
— Tudo bem, então...
— Hein? E o professor? Ele deve estar morrendo de raiva!
— Ah, está sim. Mas não por você. Acontece que o carro dele quebrou no meio do caminho e o seguro não quis arrumar. Deu o maior "B.O."! Ele não virá hoje. Parece que a lei de Murphy resolveu visitar o professor, né?

Peculiaridades: cuidado ao escolher um restaurante


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Estava no ônibus, semana passada, quando ouvi a conversa de dois garotos que estavam sentados no banco atrás de mim:

Garoto 1: Tá vendo esse restaurante? A gente não pode ir nele, nunca!
Garoto 2: Hein? Por quê?
Garoto 1: Porque isso nem é restaurante! — dizia num tom indignado.
Garoto 2:  Não entendi...
Garoto 1: Outro dia, o pessoal inventou de ir lá. A gente tava morrendo de sede. E aí pedimos refrigerante... E o cara falou que não tinha. Só tinha água.
Garoto 2: Nossa! — e começou a rir.
Garoto 1: Mas o pior foi que ele disse que só tinha água da torneira.

O garoto 2 começou a dar muitas risadas.

Garoto 1: Aí perguntamos o que tinha de lanche. E o cara me fala que só tinha X-Salada. Pô, que restaurante é esse que só tem água da torneira e X-Salada? Que deve ser de hamburguer podre, né? O pior de tudo é que só me faltava ele querer cobrar água da torneira! Aff, o povo inventa cada lugar pra comer e depois eu que me dou mal. Mas essa cidade é um lixo, viu?

Só sei que eu nunca irei naquele restaurante. Se é que dá pra chamá-lo assim. Atenção para não acabar almoçando X-Salada e água da torneira.

Má sorte?


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Quando algo terrível acontece justamente conosco, costumamos dizer que é falta de sorte. Mas com Nicole, não era apenas falta, mas sim uma maré de azar. Era atrapalhada e desorganizada. Sua vida parecia não ter um caminho certo, um objetivo.
Nicole odiava como vivia de modo desventurado. Era apenas olhar para ela, para perceber. Os cabelos castanhos desalinhados, uma combinação confusa e simples de roupas — usava um jeans velho e camisa xadrez, sem prestar muita atenção às cores e sem muitas opções de roupas, a maioria tinha manchas de molhos e refrigerante. Essa sua bagunça muitas vezes a impedia de ver no espelho a graciosidade dos traços delicados de seu rosto e de seus lindos olhos azuis. Seus planos sempre terminavam em desastres, confusões ou prejuízos.
Mas isso não era o pior. Nicole não tinha entusiasmo. Nada acontecia em sua vida e por isso ela foi desistindo de tudo. Desistindo da carreira, desistindo do amor... e tudo que o ser humano adora sonhar.
O que eu sei é que Nicole não era boa em matemática, ou física, porém era uma artista plástica nata. Queria ter sua própria coluna numa revista sobre artes.
"Isso é difícil demais para acontecer comigo..." — pensou.
E foi assim que o "azar" fez Nicole desistir.
Na hora do almoço do seu emprego quezilento, foi até a cafeteria, comprou chá gelado e tropeçou numa criança derrubando metade do copo em sua blusa e ainda levou uma bronca da mãe rabugenta. Costume. Cansada, sentou-se perto da janela e começou a observar as pessoas.
Entrou alguém que já conhecia de vista. Não sabia o nome, mas ele sempre aparecia. O ruivo sorridente, bonito e bem arrumado. De segunda a sexta ele passava ali. E ela até gostava. Mas hoje, ele estava diferente. Para a surpresa de Nicole, ele sentou-se. Ele nunca demorava mais de 5 minutos. E ele continuou ali. Nicole ficou acanhada. Ele estava próximo e poderia vê-la. Sentiu-se muito desarrumada para ser olhada por alguém. Rapidamente, pegou sua mochila e saiu. Derrubando algumas coisas pelo caminho, é claro.
No dia seguinte, voltou. No mesmo horário, ele já estava lá, com um notebook. E Nicole com seu caderno de desenho, resmungava consigo mesma.
— Só isso Nicole? — disse Lucas, seu amigo que trabalhava na cafeteria.
— Ahn, é. — ela revirou a mochila, não encontrava a carteira. — Ah, droga.
No mesmo instante, o ruivo parou de digitar e olhou para os dois. Levantou-se e foi até ela.
— Desculpe, eu estava ouvindo. — entregou uma nota para Lucas e sorriu — É horrível esquecer a carteira.
Nicole ficou espantada. Lucas riu:
— Acontece com ela pelo menos uma vez por semana. Quando ela não perde a carteira... Já trago o troco. — e saiu.
— Obrigada, mas eu pago pra ele depois. Não precisa se incomodar. Ele tá acostumado já com essas minhas...
— Relaxa, tá tudo certo. — interrompeu.
Nicole ficou parada.
— Sempre te vejo aqui.
— Me vê? — Nicole arqueou as sobrancelhas.
— Estamos sempre aqui no mesmo horário a tanto tempo, mas nunca nos falamos.
— Minha vida é meio desastrada.
— Ah, é. Eu acho você engraçada. Parece espontânea.
— Isso é uma forma gentil de dizer desajeitada?
Ele riu. Lucas voltou e entregou o troco.
— Aqui Diego. Valeu!
— Diego? — perguntou Nicole.
— Arrã. E você é?
— Nicole.
— Ah Nicole, infelizmente eu vou ter que ir. Mas nos encontramos amanhã, ok?
Ela mal conseguia responder. De repente... isso mesmo era real? "Amanhã... provavelmente estarei internada no hospital, do jeito que eu sou sortuda" — pensou ela.
Ele partiu. E ainda perplexa, lembrou-se de voltar a respirar.
No dia seguinte, mesmo depois de ter sido atropelada por uma bicicleta, Nicole chegou viva na cafeteria, com algumas manchas de graxa na barra da calça. Diego logo sentou-se com ela e começaram a conversar. E isso se repetiu por vários meses.
— Então, você não gosta do seu emprego? — objetou.
— Não... mas o que eu posso fazer?
— Nicole, eu não acredito. Quando eu observava você — isso fez o rosto de Nicole arder — te achava do tipo aventureira...
— O quê?! Rá, rá, rá... Eu tento preservar a minha vida!
— Que vida? Eu acabo de descobrir que você não tenta fazer nem o que gosta! Você não se arrisca!
— O que quer que eu faça? Eu já tentei...
— Você deveria confiar em você. Olha, eu trabalho numa editora. Seria tão fácil se você tentasse com confiança! Eu a ajudaria.
— É fácil pra você Diego. Pra mim, é difícil as coisas acontecerem.
— Porque você vê desse jeito. Você é quem deveria fazer a sua vida. Não o "azar"...
— Eu preciso ir...
Nicole sentiu-se péssima por causa da última conversa e não voltou a cafeteria naquela semana. Chegou a conclusão, que era uma ilusão imaginar que Diego gostaria dela um dia. "Mais uma derrota."
Na segunda-feira seguinte, quando chegou no escritório, ao colocar sua mochila na mesa, notou um post-it:

Você vê dificuldades ou possibilidades?
Eu vejo em você uma possibilidade.
Diego

Os pensamentos de Nicole entraram em choque. Esse tempo todo, ela nunca via uma possibilidade. Desceu até o térreo, precisava falar com Diego. Mas para sua surpresa, ele já estava a sua espera. Ela sorriu e finalmente enxergou que ele era sua oportunidade de mudar e tentar.
— Você é a minha possibilidade de ser melhor e mais feliz. — disse Nicole.
Demorou um tempo, mas Nicole tornou-se ilustradora de uma revista e mais tarde ganhou a sua coluna. Não deixou de queimar o bolo, quebrar os copos, machucar-se frequentemente ou esquecer a carteira. Afinal, era seu jeito esquecido e bagunçado. Que Diego adorava. E dessa vez quem perdia era a má sorte.

Mundo rotulador


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Quando você vai ao supermercado a procura de Toddy, você o identifica pelo rótulo. Mas e se um dia você compra seu Toddy e quando abre... Oh! Está cheio de marshmellows! Eu sei que não faz sentido, mas é o que nós acabamos fazendo com as pessoas. Colocando rótulos. 
Talvez você não saiba, mas existe até um nome bem culto pra isso: estereotipação. Figurativamente, estereotipar é tornar fixo, inalterável. Por exemplo, loiras são burras. Estilistas são gays. Políticos são ladrões. Coisas assim... 
Mas esquecemos que cada pessoa é única. Pode existir uma maioria, porém há uma minoria. E por que aqueles que fazem parte da minoria devem ser ignorados? Ei, eu sou diferente! Não quero ser generalizada! 
Então, imagine um mundo rotulador: onde todo mundo andasse por aí com um rótulo na testa e as pessoas se tratassem pelo que está escrito no rótulo e não pelo que realmente são.

— Emília, você vai contar essa história pra Carla? 
— Ela é minha superamiga! Precisa saber!
— Você tá louca? Olha lá, tá escrito fofoqueira. Não conta, não!

— Caramba, esse médico é formado na USP! Mas eu não vou me consultar com ele!
— Por que não?
— Você não leu a testa dele? É drogado!

— Credo, esse cara é tão mal humorado!
— Você devia andar com ele, é uma boa companhia.
— Ahn? Ele é tão ignorante. Me sinto mal perto dele.
— Claro que não. Ele é bem humorado. Você que não soube ler direito...

— Estou apaixonado pela Mônica!
— Você não vai se dar bem com ela.
— Mas ela é tão simpática!
— No rótulo diz arrogante...

Talvez você nunca encontre marshmellows dentro da embalagem de Toddy. Talvez você não goste de Toddy, então sempre irá ignorar seu rótulo. Mas com certeza encontrará uma surpresa em alguém. E conteúdo é o que convence.

Distrações


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A mãe de Larissa chamava sua atenção constantemente. Todos tinham que gritar seu nome para que ela ouvisse. Mas não porque ela era surda, na verdade, ela era bem distraída. Foi essa desatenção, ou "excessiva distração" como sua amiga Nathalia chamava, que fez com que Lari fosse bem atípica.
Era sábado de manhã, e Larissa foi até a lanchonete próxima a praia, como de costume. Entrou e sentou em qualquer banco pegando o cardápio.
Um rapaz, começou a pigarrear. Mas Larissa não deu muita atenção, estava mergulhada em seus pensamentos. Eram pensamentos malucos, perguntas para si mesma, reflexões que somente  ela mesma se entenderia.  Passou-se alguns minutos e ela continuou a olhar fixo para o cardápio, sem prestar muita atenção. Ainda estava preocupada com outras coisas, quando:
— Tem que pedir antes da meia noite. A lanchonete fecha, sabe?
Larissa pulou da cadeira. Seu coração estava disparado, quando repentinamente notou um rapaz  desconhecido na mesma mesa. Ele riu.
— Eu a assustei?
— Ah, não... por que eu estaria assustada? — respondeu em um tom sarcástico — Tem um monte de mesas e um completo desconhecido se senta bem na minha frente! Eu posso saber por que tá sentado aqui? — Larissa o fuzilou com os olhos.
— Eu te faço a mesma pergunta. 
— Vem cá, você é doido?
— Provavelmente, não tanto quanto você. Ou talvez eu seja louco e você cega!
— Que grosseria! 
O rapaz riu outra vez.
— Tudo bem, apesar de eu ter chegado aqui primeiro. E você ter ocupado o meu lugar, — dizia gentilmente — eu vou ser educado e escolher outra mesa.
— Como assim você chegou primeiro?!
— Cheguei. E se aqui tivesse uma câmera, eu provaria pra você.
Larissa ficou muda. Como poderia ter ocupado uma mesa que já estava ocupada! Seria tão distraída, a ponto de além de ser "surda", ser "cega" também?
— Eu... er... — gaguejou.
— Tá tudo bem, eu já disse. — o rapaz estava se levantando quando Larissa o puxou de volta.
— Ah, me desculpe! Por favor, fique aqui. Eu vou pra outro lugar e perdoe a confusão. — ela ficou vermelha. 
— Nós podemos dividir a mesa, então?
Larissa sorriu. Deixou por um momento suas distrações, e começou a perceber o rapaz bonito que ele era. Alto, cabelos castanhos claros, belo sorriso... mas até sua beleza a distraiu. Foi assim, que Larissa o conheceu. Aquele desconhecido que transformou-se em seu futuro marido.

Drama e Comédia


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Amanda era uma adolescente comum de 15 anos com apenas um defeito: era super dramática! As pessoas a chamavam de rainha do Drama. Sua vida era uma autêntica novela mexicana. Tudo era só reclamação.
Até que um dia, uma nova garota chegou na cidade. Amélia era totalmente o oposto de Amanda, no entanto, as duas tornaram-se melhores e grandes amigas. Nunca a frase "os opostos se atraem" foi tão verdadeira. Elas eram juntas a Chuva e o Sol, o Amargo e o Doce, o Negativo e o Positivo, o Drama e a Comédia!
— Amiga! Que tragédia...
— Ai, que houve? — respondeu Amélia, com a boca cheia de salgadinhos.
— Você não vai acreditar! — gritou Amanda de olhos arregalados — Minha tia, vai casar!
— E a tragédia é...?!
— O noivo dela têm 89 anos de idade! 58 anos, mais velho!
— Não brinca? — gargalhou Amélia.
— Isso é muito triste... imagina a vida dela...
— Ele tem grana?
— Extremamente rico. Acho que ela nunca vai ser feliz. Será que ela o ama?
— Se ela o ama, eu não sei. Mas dinheiro...
— E se as pessoas falarem dela! Que ela casou por dinheiro! Ah, que horror! 
— Tsc... não esquenta! Ele não vai aguentar uma semana, aposto!
Amanda paralisou.
— É verdade... mas isso parece ser ainda pior! Então, você acha que eles vão se separar em uma semana?!
— Quê? Separar em uma semana? Rá, rá. Eu acho que ela fica viúva antes disso.
— Não! Se ele morrer uma semana depois do casamento, as pessoas vão pensar que foi a minha tia!  Que ela é uma assassina, que ela deu o golpe do baú, porque só tem 31 anos... e provavelmente, ela será presa! — Amanda perdeu o fôlego — Eu não posso ter uma tia presa! Eu não posso deixar minha tia ser presa!
Amélia ficou boquiaberta. Soltou um risinho e disse:
— Sossega teu desespero, mulher! Deixa sua tia ser feliz! E mesmo que ela vá presa, aí a gente faz o casório dela com meu tio.
— Seu tio é advogado?
— Er, na verdade, ele tá preso.